Entrevista ao Presidente da Associação ABRAÇO, Gonçalo Lobo
29 - nov. - 17
No ano que a Abraço celebra o seu 25º Aniversário, a BOL associa-se ao evento “GALA ABRAÇO 25 ANOS”, realizado na data em que se assinala o Dia Mundial da Luta Contra a SIDA.
Fomos saber mais sobre este tema, e por isso realizámos uma entrevista ao Presidente da Associação ABRAÇO, Gonçalo Lobo.
Gonçalo Lobo, Presidente da Associação ABRAÇO
Quando a Abraço foi fundada, o VIH/SIDA ainda era um flagelo em todo o mundo. 25 anos depois, o que é que mudou?
O aumento da qualidade de vida e os avanços terapêuticos. Hoje em dia as terapêuticas disponíveis têm uma eficácia muito superior e são muito menos tóxicas para o organismo, provocando menos efeitos secundários e menos complicações futuras. Com estas melhorias foi possível aumentar a média da esperança de vida das pessoas que vivem com o VIH e foi possível envelhecer com o VIH com uma qualidade relativa, algo que era impensável nos anos 80 e 90. O que ainda não mudou é que, de fato, o VIH ainda continua a ser um flagelo a nível mundial e que é preciso tomar ações que permitam, o diagnóstico precoce da infeção, a ligação aos cuidados de saúde, a disponibilização imediata de medicação e a retenção das pessoas que vivem com a infeção nos cuidados de saúde. Uma pessoa que tenha uma carga vírica indetetável não consegue transmitir o VIH a outra pessoa. Uma simples equação que explica muito bem este conceito em português é, i = i (indetetável = intransmissível) ou como é internacionalmente conhecida, u = u (undetectable = un-transmittable).
As pessoas com HIV/SIDA ainda são alvo de preconceito?
Todos nós somos alvo de preconceito na medida em que este processo mental nos ajuda a guardar informação e a categorizar as coisas. O problema ocorre quando estes preconceitos são negativos, depreciativos e se transformam em estigma e em última análise num ato discriminatório. Ser alvo de estigma é algo difícil de quantificar-se, até porque muitas das vezes não é declarado/manifesto e não passa para a discriminação. No entanto há um estudo internacional denominado Stigma Índex que detém alguns indicadores nesta matéria. A nossa intervenção centra-se, primariamente, na própria pessoa e desta não se autoestigmatizar por ser portadora da infeção ou por ter incorrido num comportamento de risco que conduziu à infeção. É importante as pessoas ultrapassarem este processo para poderem projetar a sua vida no futuro. Numa fase posterior, caso haja indícios claros de que as pessoas estão a ser alvo de discriminação, aí sim, incorremos judicialmente contra as respetivas entidades.
De que forma é que a Abraço ajudou as pessoas que vivem com o VIH e as suas famílias?
A ABRAÇO já ajudou muitas pessoas desde a sua criação. Desde tratamentos dentários, acompanhamento psicoterapêutico, apoio domiciliário, entre outros, há um conjunto vasto de respostas sociais e clínicas que oferecemos e que permitem aos nossos utentes usufruir ou gratuitamente, ou por um custo reduzido. Mas há uma coisa que tentamos incutir nos nossos técnicos, que sejam o mais humano possíveis com os nossos utentes, que saibam dar carinho, que saibam ouvir, chamar a atenção quando necessário e felizmente em muitos casos somos vistos como uma família e um porto de abrigo.
Como é que vive uma pessoa, portadora da infeção pelo VIH, nos dias de hoje?
Vive como qualquer outro português, com maior ou menor dificuldade, dependente do seu estrato económico. A infeção pelo VIH muda uma coisa na vida da pessoa, passa a tomar uma medicação todos os dias para o resto da sua vida, até que a cura seja encontrada. De resto, não há mais alterações, são tão ou mais capazes que qualquer outra pessoa em todas as áreas. Fato é, que as pessoas tendem mais a isolar-se e a não terem relações sociais e afetivas significativas, devido ao receio de ter que revelar o seu estatuto serológico.
Qual foi o maior avanço na medicina em relação a esta infeção?
A introdução da terapêutica antiretrovírica de alta potência, ou seja, as combinações de vários agentes que atuam a vários níveis e que permitem a supressão da carga vírica.
Quais as principais novidades da edição deste ano da Gala da Abraço?
Felizmente, desde o ano passado, que temos assistido a uma nova leva de transformistas (Drag Queens) e cross dresser’s que estão cada vez mais andrógenos e a fugir do binário homem-mulher. Esta posição mais contemporânea a atual e ligada à identidade psicológica e não biológica, conduz à atração de um público mais jovem também. Outro fator que tem contribuído é a realização de um concurso e respetivos prémios associados que dignificam a arte do transformismo. É muito engraçado para nós, percebermos que esta Gala para eles e o respetivo prémio de melhor atuação da noite e melhor imagem é transposto, com orgulho, para as redes sociais. Está na altura de todos nós percebermos que os direitos sexuais e de género são uma realidade atual, e quem lhes ofereça resistência vai ficar muito mal visto. Este ano temos a particularidade de ser a 25.ª Gala que coincide com o nosso 25.º aniversário e como em qualquer aniversário, não poderá faltar um bolo de aniversário para podermos todos cantar os parabéns.
Gonçalo Lobo, Presidente da Associação ABRAÇO